sexta-feira, 26 de junho de 2015

SONETO VIII



VIII

Cantadores chegavam nos gaiolas
resplandecendo trovas consteladas,
e entre os sabores negros da partida
ardiam no alecrim das madrugadas.
Luas multiplicavam seus cavalos,
dragões comiam flor; e no tormento
das fogueiras solares se expandiam
desdobrando os cordéis do pensamento.
Comparava-se o mundo a qualquer bicho
que anda chutando os pobres de sua terra,
bicho-papão de sonhos e quimeras.
Nordestinadas levas, seringueiros
dos quais resta essa dor, viola serena
que nos consola porque vale a pena.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

SONETO VII



VII

Sítios da infância, cálidas pitangas
avermelham no cio das cadelas.
Meninos e meninas no barreiro
e a vergonha desaba das janelas.
Bancos de praça rubros amanhecem,
saltam cabaços vivos em memória
de quem chega mas parte; e logo os ventres
a seu tempo confirmam cada estória.
Sobem depois as águas das enchentes,
latifúndios rastejam sob a lama,
montarias a esmo invadem ruas.
As chuvas lavam com rigor tamanho
que após ter o dilúvio sossegado
ficamos limpos, todos, do pecado.

quinta-feira, 11 de junho de 2015

SONETO VI


VI

A lua envelhecida ocupa os ares.
Desce inteira das nuvens, e assim plena
larga todas as vestes. Mês de junho
sabe a feitiço e os peixes envenena.
Algo desata a flor dos jasmineiros,
ventos carregam súplicas e brados.
Essa lua, porém, de que me lembro
tem o rosto senil dos afogados.
Jovens que se largaram pelos rios,
braços rijos nas faias, nunca mais
regressaram das margens convulsivas,
dos laços de algum réptil. Que eu recorde
todos dormem sonhados pela aragem,
ecos perdidos numa só voragem.

segunda-feira, 1 de junho de 2015

SONETO V

V

Eu disse um grilo ou coisa que, inventada,
foi motivo de súbita alegria;
uma palavra nova, enfim, naquele
deserto de palavras, florescia.
Os zéfiros dos livros e a brancura
das estrelas, depois, foram caindo
sobre as casas e as ruas; andorinhas
já não sabiam de onde estavam vindo.
Ouviram-se martelos que batiam
cravos de sol previstos para a carne
de quem se alara tanto, além das aves
e das cercas antigas e dos campos:
este ser pequenino, hoje encolhido

neste velho teimoso e distraído.