quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Nova saga do cachimbo


Nova saga do cachimbo



Por Jorge Tufic





Para Haroldo de Campos, i.m







I



Na fria sala a brasa do cachimbo

queima o sândalo morno dos retratos;

tela à distância em que me vejo, nimbo

de outros corpos em torno de outros pratos

em torno de outras mesas; quanto limbo

de uma história que esqueço; estes relatos

vão-se nos rolos brancos: o elo o chimbo

restante da palavra ou destes fatos.

Na fria sala o sol visita o lenço

que deitei sobre lágrimas, e o grito

em cujas notas, hálito, me penso.

Sou página de ensaio sou refino

daqueles que me habitam, do que habito,

fábula tosca em noites de violino.





II



Agora que sou épico modelo

com as faias de Caronte o rosto amargo

desse mar que foi teu, já feito ao largo

a partir de uma estampa ou dum castelo.

Pouco importa se o texto é paralelo

às orlas de tua sede: o nobre encargo

de traduzir solapa as pautas de argo

como um barco se atira contra o belo.

Campos de Haroldo é A última viagem,

Calipso XXIV e Ulisses, este

que a Telêmaco entrega a própria imagem;

ou seja, o cetro e a ilha mais ofícios

de ampla ternura; e que se ponha a veste

dos deuses-lares para os sacrifícios.








III



Cachimbo a solidão deste feriado

quando a urbe completa fica ausente.

Henrique L. Alves surge reluzente

mas logo esvai-se para o Outro Lado.

Muitos partiram, raros têm ficado.

Nas ruas e nos prédios diferente

é o som das pedras largas; pouca gente,

fotomontagens, tempo sossegado.

Um pássaro bizarro altera o clima

do olhar sobre estas coisas; nada o prende

sendo ele vários, prévio, tarde acima.

Outros momentos cruzam-se (de leve).

Alguém pára, se volta; e, ao cabo, entende

que a permanência é estática, mas breve.





IV



Que são, final, cereja, noz, baunilha

no aspirado fruir da gema arcaica?

Pajé lendo caminhos saga incaica

dos primevos cachimbos? De que ilha

nascida de um trigal ou de uma antilha

veio até nós o argílico mosaico

o seco olhar da pedra o signo laico

de gravar entidades numa bilha?

Assim deve ter sido, a par do vinho,

a gênese do fumo e da fumaça:

aquele tinto, a outra feito arminho,

esta saindo em dueto, oval, discreta,

para depois fundir-se no que passa.

E no que passa, funde-se o poeta.


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