domingo, 25 de março de 2012

DUETO PARA SOPRO E CORDA


SONETO PARA MARCOS GOMES

Com meu alef te brindo por ser abd
Das suras no adaã que faz  o adab
Dos sábios na adafina da linguagem
Dando ao soneto acordes de alaúde.

Navegas como a lua sendo alfange
Despertando anafis, andaluzias,
Polissêmicos fogos, Meca e pedra,
Tal fossem os arabescos de alefris.

Sem aravias, o alcatrão destilas
De um novo idioma a síntese, o acanto
Trançado com jasmins para o salã.

Despertas Mai das noites indormidas,
Serralhos do Butão; e esta vontade
De ser derwiche, um zégel solitário.

Jorge Tufic

Glossário

Alef- principal letra do alfabeto arábico.
Abb- servo; escravo de.
Sura- série, sequência, o mesmo que surata.
Cada um dos capítulos do Alcorão.
Adaã- fala do muezin do alto do minarete,
convidando os fiéis à oração.
Pedra- Pedra Negra, objeto que é o centro
simbólico de todo o Islã; foco material de
toda a religião muçulmana.
Adafina- coisa oculta; tesouro.
Anafil- longa trombeta usada pelos mouros.
Alefris- incisão, corte, entalho.
Aravia- arabia, linguagem atrapalhada e difícil.
Algaravia.
Salã- a paz (de Alá seja contigo). Palavra de
saudação ou cumprimento. Salmo, salema.
Mai- pseudônimo de Maria Zlady, poetiza
árabe contemporânea.
Serralho- harem.
Derwiche- místico de seita islâmica.
Zégel- bailado; gênero de poesia popular em
Al-Andaluz.




quarta-feira, 21 de março de 2012

CARTA AO JORGE TUFIC

CARTA AO JORGE TUFIC

Jorge Tufic, o meu nome é José Martins Rocha, sou um caboclo de Manaus, tenho um blog denominado BLOGDOROCHA, voltado para a cultura amazônica, cheguei até você através do poeta e escritor Rogel Samuel. Estou sabendo que você acabou de fazer 80 anos de vida, que coisa boa e bonita! Parabéns, meu amigo!

Não sei se você foi homenageado em Manaus, caso negativo, irei fazê-lo agora, neste pequeno espaço.

Jorge Tufic, um brasileiro de Sena Madureira (Acre), nasceu poeta, pois o poeta não se faz, ele já nasce feito! Morou e produziu muito na cidade de Manaus, foi agraciado, em 1976, como “O Poeta do Ano”, homenagem do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Amazonas.

Foi um membro ativo do “Clube da Madrugada”, da Academia Amazonense de Letras, da União Brasileira de Escritores e do Conselho Estadual de Cultura. A data maior do Estado do Amazonas é no dia 5 de Setembro, na qual se comemora a sua liberdade política – Jorge Tufic foi a pessoa que fez a letra do “Hino do Amazonas”, que coisa bonita ele escreveu: “Amazonas, de bravos que doam. Sem orgulho, nem falsa nobreza. Aos que sonham seu canto e lenda. Aos que lutam mais vida e riqueza”. Palmas, muitas palmas para o Amazonas e para o Jorge Tufic!

Ele foi um funcionário público, ao se aposentar mudou-se para Fortaleza, onde passou a exercer integralmente a literatura. Escreveu "Varanda de Pássaros",  "Poema-Coral das Abelhas", "Agendário de Sombras", "Trinta Anos de Clube da Madrugada", "Chão Sem Mácula", "Sonetos de Jorge Tufic" e outros tantos.

Jorge Tufic, que Deus o proteja. Parabéns pelos seus oitenta anos! Valeu!

segunda-feira, 19 de março de 2012

DUETO PARA SOPRO E CORDA


SONETO AO MILÊNIO TERCEIRO


Ave, milênio, pássaro trazido
por um suflo de abelhas; avezinha
desse cosmosertão onde luzinha
se vê da terra, peixe adormecido.

Facto novo, talvez, mas consabido,
pois o mito é lonjura que se aninha,
quer na estrela que foi-se quer na asinha
de um beija-flor que azula, desistido.

O qual será de nós esse translume,
essa fogueira astral de plenilúnios,
essa coragem de voar, implume.

De argamassa infantil são nossos barcos.
Voltamos a ser chuva. Os infortúnios
darão vez a outros seres, menos parcos.

quinta-feira, 15 de março de 2012

QUANDO AS NOITES VOAVAM


subindo pelo lado esquerdo do lago do leite, e. s. Pan Iãmin e e. M. Boléka
foram colocando casas de transformar gente

XI

Boléka, o chefe supremo dessana,
olhara detidamente para o sol
quando todas as casas invisíveis
tornaram-se numa Grande Maloca.


Pedaços de claridade, objetos,
peles de onça, foram sendo preparadas,
entregues e vestidas
pelos grupos heroicos dessa tribo.


Casas transformadoras e casas terrenas
abrigavam riquezas e onças ferozes.

terça-feira, 13 de março de 2012

DUETO PARA SOPRO E CORDA


SONETO PARA SALVATORE QUASIMODO


Vejo os telhados: nunca uma só telha,
que esta sozinha pouco se reflete;
Camões inteiro cabe num disquete
como cabe a galáxia na centelha.

Vejo ao lado Quasimodo, que a velha
foto consome à luz que a si remete
árvores mortas; e, sob o colete,
pulsa a criança que seu rosto espelha.

Veladas eras; cânticos noturnos
te iluminam d’imennso; as mãos no bolso
sancionam terremotos e massacres.

Passaram guerras, botas e coturnos.
Ao descer ao mais fundo calabouço,
detonantes manhãs rompem seus lacres.

sábado, 10 de março de 2012

QUANDO AS NOITES VOAVAM



Ao chegarem na quadragésima casa,
desembarcaram as primeiras mulheres.

nenhuma delas ainda tinha vagina,
somente o buraquinho de mijar.

os índios de cu branco,1 por sua vez,
ainda não tinham descoberto os furos
que guardavam a música do sopro.

nem sabiam vestir-se como os passarinhos.

1. os índios de cu branco são descendentes do trovão Guelabé-Bolei.

Por esse tempo,
os cabelos da humanidade eram tão brancos
que pareciam flocos de algodão.


Mas ao chegarem na quadragésima quinta
/casa transformadora,2
seus cabelos ficaram pretos.


Aí, sim,
todos pisaram a terra pela primeira vez.

quinta-feira, 8 de março de 2012

QUANDO AS NOITES VOAVAM,



Continuando a viagem,
os dessana seguiram no bojo do terceiro trovão
/Canoa Transformadora.


Já no rio Tiquié,
as mulheres começaram a enluar.
Tudo acontecia pela primeira vez.


numa serra de pelos dourados,


o Criador do Universo açoitou os meninos
de toda a humanidade,
para crescerem e ficarem fortes.
depois disso,
a Canoa submergiu novamente.
Além dos dessana, baixaram com ela os Tukano,
Pira-tapuia, siriana,


o Maku e o branco.

segunda-feira, 5 de março de 2012

AGENDA 1965



30/abril

Recebi ¨Senda Bruta¨, do paraense Idelfonso Guimarães, bom contista. Em frente ao jornal me deparo com o Dr. Álvaro Maia. Estou em falta com ele. Preciso reler o ¨Buzina dos Paranás¨. Amanhã o Suplemento Madrugada mostra a cara trazendo uma reportagem e uma crônica de minha oficina. À noite, com Aluísio e outros companheiros no ¨Las Vegas¨. Até os primeiros clarões do sol de maio.

01/02/maio

Lançamento de ¨Três episódios do rio¨, do poeta Elson Farias. Falam no ato o presidente do Clube da Madrugada e o Governador Arthur Reis. Pela terceira vez este me pede os originais do livro ¨Clube da Madrugada: 10 anos de existência¨, para ser publicado nas edições Governo do Estado.- A fazer analogias cabalísticas, os ciclos de provação terminam este ano.

03/maio

Eu não tenho como sintonizar a ¨Hora do Brasil¨, conforme recomendou o Murilo. Ela deverá anunciar os decretos de readaptação assinados pelo Presidente Humberto Castelo Branco, isso a qualquer momento. Estive ontem na casa do comerciante Arnulfo Afonso, amigo do Aluísio, convidados que fomos para a devoração de uma suculenta tartarugada. Com a palavra, tive que agradecer ao anfitrião em nome dos comensais. - Na DRT, novas acomodações das carteiras para o funcionamento das Turmas recentemente designadas. Os dias se repetem numa escalada irritante. Entrevista com o Afrânio Castro. Manhã buliçosa. À noite enfrento pilhas de matérias pendentes de revisão.

sexta-feira, 2 de março de 2012

QUANDO AS NOITES VOAVAM

Certo dia, porém,
as visões do Caapi borraram e multiplicaram
os desenhos da planta de arumã.
As cores desses desenhos
também se multiplicaram.
Caras e enfeites mudavam de pessoa.


Como as visões eram tantas,
os sexos uivaram como lobos
rompendo as amarras de tucum.
os irmãos chamaram-se de primos,
as tias, de sogras.


A partir daí,
cada qual passou a falar diferente.
ninguém mais se entendia.


Toda a humanidade, contam,
ficou sob os efeitos da bebida.


As tribos se dividiram,
cobras-canoas enfiaram por outros rumos,
levando e plantando gente.


Foi quando os dessana e os Tukano
se uniram para sempre.