segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
QUANDO AS NOITES VOAVAM
navegando debaixo das águas,
a Canoa Transformadora dos dessana
plantava e numerava.
enfeites transmutavam-se em gente.
de um rosto subitamente visível,
brilhara o sol, lá no alto.
os trovões já tinham os seus nomes,
as casas já tinham seus números,
os bichos e as frutas
já tinham os seus donos.
Todos habitavam a esfera do universo,
que era o modelo da maloca.
sábado, 25 de fevereiro de 2012
QUANDO AS NOITES VOAVAM,
Cada ser, objeto ou ritual,
já nasceu com seus lugares.
substantivos ganhavam corpo, som,
transparência e volume.
Mas somente o ipadu e a casa
dirigiam a transformação,
cuidavam da paisagem.
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012
DUETO
SONETO À TEIMOSIA
Coração verde é o coração da gleba
adubado por crostas milenares;
lá onde mares críticos de ameba
guardam anjos de augustos lapidares.
Mas, peraí jumentos destes ares,
que o verso musical a musa enseba;
e no sebo dormitam jugulares
dantanhos seres como o velho peba.
Modernidade azul, que já não fazes
com a mistura das letras, dos cartazes,
da bosta urbana com pesados sinos!
Deter quem há-de a marcha da serpente,
a voz do mito, o feto opalescente
que se agarra aos despojos uterinos?
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012
DUETO PARA SOPRO E CORDA,
SONETO-INTRODUÇÃO À GRANDE
NATUREZA MORTA METAFÍSICA,
DE GIORGIO MORANDI
de lado, posto-sol na veneziana,
teu busto colhe a nesga de mistério
e forma, no desnudo instante vivo
que te mostra, espacial, contrito gesto
errando à luz alegre do suposto
jarro, guardião feliz em meio à sala,
em meio à chuva rente que te envolve
e lenta, lenta, a solidão modela:
algo assim que a percorre como o raro
amor cuja medida se consome
antes de, amor, ganhar-se em consistência:
assim te vejo, imagem da criadora
força máscula, plástica e divina
por que aspira a matéria, e se eterniza.
sábado, 11 de fevereiro de 2012
QUANDO AS NOITES VOAVAM
IV
Com a barriga-universo-gente
surgiram os homens da pedra branca;
homens-trovões, pedra,
gente que não morre.
Todas as coisas ainda eram invisíveis.
nada podia ser visto ou tocado.
Com a ajuda do bastão invisório,
Yebá beló cortou a terra e o espaço
em camadas sucessivas.
o mundo, então,
ficou dividido em camadas.
enquanto isso,
Yebá beló espalhou sementes de tabaco
e derramou leite em cima das esteiras
de palhas e cores diversas.
estas sementes de tabaco
logo serviram para formar a terra
e o leite, para adubá-la.
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012
DUETO PARA SOPRO E CORDA
AOS
CONFRADES E AMIGOS DO CHÁ DO ARMANDO
Ao Chá do Armando a taça que faltara
quando,
sem mim, quiseram-me presente;
e aos oitenta que sou,
alegremente,
um dia a mais tão logo
acrescentara.
Laços comuns, saudades,
uma rara
força
nos une transcendentalmente;
pois,
sendo longe, o perto se consente
anular
a distância que separa.
Fica-me
bem ser lágrimas e rosas.
Mas
como agradecer aos meus amigos
pelos
brindes, com rimas fastidiosas?
Contudo,
a gratidão me transfigura.
Sou-lhes
grato, meus últimos abrigos,
companheiros
da luz em noite escura.
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012
DUETO PARA SOPRO E CORDA,
SONETO
A QUATRO MÃOS (*)
O
poeta Simônides falando
mandou
às favas gregos e troianos.
Considerou
o Bem um Mal nefando,
Sem
lugar entre os bípedes humanos.
Tentar
organizar-se é um desmando
que
não seduz ao Caos nem aos arcanos.
-
Ao templo labiríntico, o comando!
A
vida é um sopro e não comporta enganos.
Ainda
disse Simônides: - Ó cínicos!
Fujamos,
pois, dos mestres e dos clínicos,
decepemos
de Hipócrates o crânio!
Tábula
rasa, o círculo e a poeira
dissiparão
a dúvida primeira
na
certeza do pássaro instantâneo.
* Com
Luciano Maia
domingo, 5 de fevereiro de 2012
AGENDA 1965
26/abril
Apesar de não ser um dia favorável, reconquisto hoje uma função gratificada perdida há oito meses. Não precisamente a que eu vinha exercendo à época, mas algo similar. Estou que os ¨feitores¨ de minha ¨caveira¨ atuam numa faixa distante do meu local de trabalho, sub-homens desprezíveis, pejorativos até do animalejo.- Embora o ¨mistério¨ acerca de nossos processos, a OB lateja em minhas raízes: ou seja, tudo o que penso (e porque penso) existe. Logo, meu empenho em obter uma coisa que esotericamente já era minha, tem sentido. Eu vou em sua direção e de quantos fenômenos se movam tomados por uma energia que se destaca de todas as demais. A isto o filósofo chamara de ¨vontade de poder¨.
27/abril
O telefone soa no Gabinete do Delegado do Trabalho, e a voz de nossa colega Dulcicléa nos passa o exigênio de que tanto necessitamos: fomos aprovados pelos órgãos competentes. Resta-nos agora esperar mais um pouco pela oficialização dos atos presidenciais. Reina alegria no íntimo de todos os colegas interessados no assunto.
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
DUETO PARA SOPRO E CORDA,
SONETOS PARA DUAS ARROCOLAGENS
DE AFONSO ÁVILA
II
Eu sou mestre de ruínas, de experiências
Farsas do Diabo, dentes misteriosos,
e de mim se não podem dar milagres
antes diabruras certas, profetizem.
Do mar se tira o sal, líquido amargo
de mim também se diga apenas ruim,
porquanto é certo que, dito o pior,
apenas se adivinha o que há em mim.
Eu sou como os trinchantes, que repartem
aos outros iguarias, e ao jejum
se entregam como os donos da vigília.
Demonios como yo quedan contigo
y los ángeles Buenos com estes hombres,
entre la cruz, los reyes y las torres.
DE AFONSO ÁVILA
II
Eu sou mestre de ruínas, de experiências
Farsas do Diabo, dentes misteriosos,
e de mim se não podem dar milagres
antes diabruras certas, profetizem.
Do mar se tira o sal, líquido amargo
de mim também se diga apenas ruim,
porquanto é certo que, dito o pior,
apenas se adivinha o que há em mim.
Eu sou como os trinchantes, que repartem
aos outros iguarias, e ao jejum
se entregam como os donos da vigília.
Demonios como yo quedan contigo
y los ángeles Buenos com estes hombres,
entre la cruz, los reyes y las torres.
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