CURVAS
DO TEMPO
Há um conto de Vladlen
Baknov em que o segredo do presente, quando vamos à sua procura no futuro,
transfere-se para de onde partimos e muda de identidade, talvez para que jamais
se possa decifrar, mesmo com a incrível ajuda de um tempomóvel, os complicados
engenhos da mente em condição de projetar-se além das fronteiras de meio século. O autor põe na berlinda um
poeta que os seres do futuro chamam de Balabachkin, pobre e anônimo em seu tempo de origem. Assim,
quando ele é descoberto, ajudado e
torna-se famoso, o condutor do tempomóvel regressa ao futuro com a finalidade
de saber qual teria sido o fim do seu grande contemporâneo. E descobre,
assustado, que o Balabachkin conhecido e venerado pelos seus descendentes, nada
tinha a ver com aquele outro que, embora tivesse seu nome, a fim de evitar
confusão e por modéstia publicava seus versos sob o pseudônimo de
U.Pimenzonoff.
Esta ficção científica nos serve para demonstrar
duas coisas: a preocupação de nossos contemporâneos com aquilo que os antigos
chamavam de posteridade, e a pouca importância que os poetas, gênios ou simples
lavradores do sonho, dão a essa coisa que tanto preocupa os ingênuos
construtores de abrigos atômicos e caixas de memórias para o futuro hipotético.
Convivendo com poetas desde a minha infância, eu lhes posso dizer que o poeta
já nasce e já é. O futuro é o seu presente e o seu presente é, obviamente o seu
futuro. Alguns poetas que no passado não foram nem mesmo percebidos, hoje
viraram ídolos. Souzândrade é um exemplo. Todavia, não quer isso dizer que
eles, em sua época, deixaram de ser reconhecidos por alguma deficiência
relativa ao modo pelo qual escreviam. O status cultural e as preferências de
gosto variam no espaço e no tempo. Todos os grandes nomes da poesia universal
somente foram reconhecidos depois de mortos. Mas isso não significa que muitos
poetas vivos não estejam vivendo a sua glória que um futuro remoto, por
circunstâncias alheias á sua vontade, deixe de aceitá-la como válida num plano,
digamos, de usos e costumes, onde a palavra, o logos, a comunicação poética a
nível exclusivamente do lúdico e do onírico, passem a uma categoria de pesquisa
simplesmente de caráter psico-neuro-vegetativo.
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